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A opinião de LARA GUINA
O culto do corpo
Lara Guina
Quase todos os dias aparecem na imprensa cor-de-rosa as figuras públicas que acabaram de ser mães - sejam elas actrizes, modelos, só famosas «porque sim» ou até apresentadoras de televisão, como é o caso da Cristina Ferreira. À fotografia desfocada, tirada à socapa, à saída da maternidade, segue-se, passado pouco tempo, o mínimo possível, a fotografia que marca o regresso à vida pública e mostra, invariavelmente, uma fantástica forma física e uma silhueta invejável. Numa sociedade onde o ideal de beleza passa pela magreza extrema, esperar seis meses a um ano para voltar a ser o que se era antes de engravidar (período considerado necessário pelos especialistas) parece uma eternidade para um número crescente de mães. Toda a gente pergunta quantos quilos se ganhou, quantos quilos já se perdeu e toda a gente lê revistas. E a frustração aumenta quando se têm como modelos as tais estrelas de cinema que conseguem ostentar aquele «corpinho» duas ou três semanas após o parto.
Acontece que, na vida real, é impossível recuperar num abrir e fechar de olhos - partindo do princípio de que é irreal para quase toda a gente passar todos os dias horas a fio num ginásio, pagar tratamentos sofisticados em centros de estética e o acompanhamento de um nutricionista ou fazer cirurgias plásticas para pôr rapidamente «tudo no sítio». A oferta de clínicas e de ginásios é grande e a publicidade é feita por figuras públicas recém-mães já praticamente elegantes, o que acaba também por ser um factor de pressão para as outras recém-mães que não têm meios financeiros para recorrerem a esse tipo de serviços.
A pressão social e cultural a que o culto da magreza dá origem já é bem conhecida das mulheres muito antes da gravidez, mas as alterações que o «estado de graça» implica tornam este um período crítico que pode fazer surgir problemas latentes. Não é isso que, só por si, desencadeia um distúrbio psicológico, mas é um factor que ajuda a agravar problemas. Estas mulheres olham-se ao espelho e vêem-se muito mais gordas do que estão. O obstetra até pode considerar que o aumento de peso está dentro da normalidade, mas estas mulheres têm formas de pensamento distorcidas, catastrofizam a realidade, pensam em termos de tudo ou nada - ou sou muito desejável ou não sou nada - e só vêem os aspectos negativos da maternidade.
Pode dizer-se que a preocupação com o peso, com o corpo, se torna patológica a partir do momento em que começa a absorver a maior parte do tempo, energia e atenção da mãe. Se a mãe só se preocupa em perder mais um quilo, a cada dia que passa, em não comer isto ou aquilo, se passa mais tempo no ginásio do que com o bebé, se estas preocupações absorvem a maior parte do seu investimento e vive em função da perda de peso, então alguma coisa não está bem.
Nestes casos, o grande passo é admitir que se tem um problema que é difícil, ou impossível, de resolver sozinha. Para se poder avançar para um processo terapêutico que possa ajudar estas mães, é preciso que ela tome consciência do problema, é preciso que pare e consiga analisar o que está a passar-se consigo. Escusado será dizer que a saúde do bebé também está em causa pois ela também depende da relação com a mãe. Também por ele, vale a pena procurar ajuda.
Psicóloga Clínica
http://laraguina-psicologa.blogspot.com/