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[entrada dedicada a todos os artistas da arte de fotografar, mas com um carinho bem especial para com o amigo sr. Carlos Ribeiro que ainda me tirou algumas fotos "com a cabeça escondida num destes caixotes", e, claro, aos fotógrafos da minha família, não esquecendo contudo aqueles homens "fazedores de imagens e de recordações surgidas do fundo de balde com água e que depois amareleciam com o tempo", afinal os aqui focados fotógrafos lambe-lambe, cujo trabalho eu tanto gostava de apreciar nas Festas da Santa Cruz no Vimieiro de há umas três ou quatro décadas]
A foto, captada em Parque de Belo Horizonte capital do Estado de Minas Gerais, documenta aquilo que foi o instrumento de trabalho de um profissional em vias de extinção: o fotógrafo lambe-lambe. Lambe-lambe, porque uma das técnicas usadas pelo fotógrafo para testar qual dos lados da chapa fotográfica contém o material sensível, impressionável, é usar a própria saliva... se a origem do nome vem por o fotógrafo lamber a chapa com a língua ou se por pressionar um canto da chapa com o indicador e polegar molhados em saliva, ou ainda se essa origem está ligada ao antigo processo chamado de ferrotipia, não se sabe bem, masem página que encontrei por aí o articulista atribui a certidão de nascimento ao teste dos dedos: gesto mágico e furtivo do fotógrafo de jardim que impressionava os populares que nada conheciam sobre a arte da luz e sombra...
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Claro que com o avançar dos tempos, com o progresso, com o advento das máquinas fotográficas de filme, primeiro, e agora digitais, o fotógrafo lambe-lambe ficou condenado ao desaparecimento. Sabendo que é o que acontecerá, dia menos dia, no entanto o fazedor de mágicas não desistiu: colocou a digital ao peito mas não se desfazendo da velha máquina de fole que, paradoxalmente, ainda será o mais apelativo dos cartazes capaz de chamar o parzinho enleado em passeio por ali para registar para todo o sempre o beijo apaixonado ou o miúdo traquinas que quer à viva força ver-se anos mais tarde montado naquela vaca de faz de conta e, claro, capaz também de manter o sustento do homem que, mesmo deixando de usar a técnica, ficará eternamente colado à fotografia lambe-lambe.
Claro que, ainda, teria que haver um português para rematar a entrada em beleza. Falo de seu Lobo, que aos 79 anos ainda exercia a sua actividade no Jardim Méier na cidade do Rio de Janeiro e que em 2006 contou à reportagem do Jornal O Globo que a última fotografia que tinha feito com o caixote fora há seis meses. Não imagino se o nosso patrício Bernardo Lobo ainda continua fotografando por lá pelo Rio, mas de maneira alguma podia deixar escapar esta, o depoimento deste aventureiro (mais um) que um dia atravessou o Atlântico em busca de uma vida melhor depois de ter feito tropa em Macau. Na sua página de relacionamentos do Orkut, ora vejam, consta que participou de um combate na Ilha de Coloan e de outro nas Portas do Cerco. Disparando em todas as direcções reclama ainda pelas pensões jamais recebidas: por seu pai Manuel Lobo (ferido na Primeira Guerra Mundial), por seu irmão (quebrou as clavículas quando militar no 6º Batalhão de Cabalaria, ora pois, do Porto) e dele próprio... estou esperando a minha e até agora nada, e remata a página no Orkut com a habitual reclamação lusitana: Será que a minha família é vítima de guerras e não temos direito a nada?
Ah carago, patrício... ferro desse não se verga, não!