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Não sei se por culpa da filha ou se por ter já saltado a barreira dos cinquenta, os pêlos dos braços eriçam e a dura couraça fica penetrável quando vejo criança em choro, não me interessando nada, rigorosamente nada, as suas origens, cor de pele, credo religioso ou condição social, porque lágrima de criança é toda igual: doçura salgada em sofrimento.
LÁGRIMA DE CRIANÇA
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Encontrei uma criança / que estava a chorar / pedi-lhe uma lágrima / para a analisar.
Recolhi a lágrima / com todo o cuidado / num tubo de ensaio / bem esterilizado.
Olhei-a de um lado / do outro e de frente / tinha um ar de gota / muito transparente.
Mandei vir os ácidos / as bases e os sais / as drogas usadas / em casos que tais.
Ensaiei a frio / experimentei ao lume / de todas as vezes / deu-me o que é costume:
Nem sinais de cor, etnia, religião / nem vestígios de ódio. / Água (quase tudo) / e cloreto de sódio.
Pequena modelação a partir de soberbo poema de António Gedeão, Lágrima de Preta, ao qual Adriano Correia de Oliveira e Manuel Freire se encarregaram de dar voz.